domingo, 28 de fevereiro de 2010

PREMIO OU CASTIGO...


Há muito tempo ele tinha aquele sonho, mas era um sonho totalmente impossível. Menino pobre, ele jamais poderia imaginar ver realizado. Possuir aquilo que era o seu objeto de desejo. Só mesmo um milagre. Mas ele não acreditava em milagres.

Ele até acreditava em Deus, mas não era de ir à igreja. E nem lembrava mais da última vez em que sua mãe o obrigara a ir à missa de domingo. Só lembrava que quando chegou em casa, contou que havia tomado a comunhão sem antes ter se confessado. Fora um Deus nos acuda.

- Pecado! Pecado! - disseram as mulheres da família. Sua mãe, suas tias e até as vizinhas, quando souberam. Ele ficou tão impressionado com o fato que chegou até a sonhar. E no sonho se viu queimando nas labaredas do inferno, enquanto um diabo de chifres e rabo lhe espetava a bunda com um enorme tridente. Um grande pesadelo. E ele nunca mais foi à missa. A primeira comunhão ele já fizera sem querer e sem saber. Daí que, milagre... Nem pensar.

Mas foi um verdadeiro milagre o que aconteceu com ele. Ele não entendeu nem como e nem porquê do fato acontecido. Na sua cabecinha de menino, não poderia haver outra explicação. Milagre! Vai ver que Deus achava que ele não era um garoto tão mau assim como diziam as más línguas. Daquele pecado de matar rolinha para comer, parece que fora perdoado. Assim como das outras travessuras e traquinagens próprias da sua idade, mas que ele não sabia que eram. Como daquela outra vez em que quebrou o vidro da janela da vizinha com a bola de meia, mas quase fez um gol. Não foi por maldade. Foi sem querer.

E também quando disseram sempre as más línguas que ele quebrou o lampião da rua com uma pedrada. Não era essa a sua intenção. Foi pura falta de sorte (ou de pontaria). Ele só queria aquela manga madurinha. Não teve a mínima culpa. Aliás, ele nunca tinha culpa de nada nas coisas que aconteciam. Muito menos daquela vez. Parecia mentira, mas não era. Era a mais pura verdade. E nem ele mesmo conseguia acreditar no que havia acontecido. O que os outros poderiam pensar? Ninguém iria acreditar na sua história. As pessoas iriam rir na sua cara. Mas era tudo verdade. Verdade verdadeira! E ele jurava por Deus. E por tudo que fosse mais sagrado.

- Juro pela minha mãe mortinha!

Chegou cansado, porém estava vivo. Suado e com o corpo todo a tremer num misto de satisfação e medo. Fora um tremendo susto quando aquele bólido caiu na sua cabeça. Levou algum tempo para entender o que estava acontecendo. Ainda agora ele não tinha certeza se tinha entendido direito. Estava tudo muito confuso em sua mente. Ele só lembrava de que quando viu o que era, se abaixou e pegou com ambas as mãos aquele objeto. Olhou para um lado e pro outro e saiu correndo como um louco numa carreira desabalada, até ter a certeza de que ninguém o perseguia.

sábado, 22 de dezembro de 2007

Leiam devagar...

Raul Augusto Silva Junior


O Sonho da Rosa...







Num certo sítio, em meio à tranqüilidade do campo, houve uma vez, na primavera, um caso muito interessante.
Lá, entre outras coisas, havia uma criação de galináceos, melhor dizendo, um grande galinheiro.
Com vários galos, galinhas e pintinhos.
Entre os galos um se destacava dos demais pelo seu porte altivo, pela sua plumagem negra e também pelo seu canto. O que fazia dele o Rei do terreiro, embora ainda fosse muito jovem.
Eis que, naqueles campos, entre tantas plantações e árvores frutíferas, floresceu um roseiral. E nele, uma rosa em especial era a mais linda entre tantas outras, também bonitas.
O galo que possuía um belo canto, vigoroso, mas também romântico e por isso era chamado de Orfeu (*), se apaixonou pela rosa.
E a rosa ficou perdidamente enamorada por ele.
E é sobre esse romance acontecido entre os dois que vamos contar nossa história.


(*) Orfeu foi um poeta grego e Eurídice a sua “musa” inspirador




Era uma vez...
Num lindo dia de sol pela manhã bem cedinho, Orfeu saltou do poleiro e cantou. Soltou sua voz e seu canto ecoou pelos campos, lindo e maravilhoso despertando tudo e a todos.
Num roseiral ali próximo, uma rosa de raro esplendor e de um vermelho escarlate suspirou profundamente ao ouvir tão belo canto.
Orfeu cantou e sem saber, também encantou.
Sacudiu suas penas negras, emplumou-se todo e saiu a passear por aqueles campos.
E com seu passo dengoso e macio foi caminhando, caminhando...
E lá se foi nosso galinho...
“Pose de general soldo de soldado raso”. Como diria minha avó.
Uma ciscada aqui, outra ali. Uma minhoca acolá.
Senhor de si, orgulhoso... Suas penas negras brilhavam ao sol.
Às vezes dava uma paradinha, levantava a cabeça e, com o bico em riste, soltava a voz novamente...
- Cocoró... Có!!!
E foi assim andando, andando...
E eis que, sem mais nem por que, deparou-se com um imenso roseiral.
Ele passeou por entre as rosas saboreando o aroma agradável que pairava no ar.
E enquanto andava, ciscava...
Bica aqui, bica ali e... Acabou bicando o caule de uma rosa, e ao mesmo tempo espetando-se num espinho da roseira.
E aí, ouviu-se um grito fino e dolorido:
- Aiiiiii!
Orfeu parou de repente, assustado com o grito e com a espetadela, recuando dois passos para trás.
Viu-se diante de uma rosa vermelha de deslumbrante beleza.
Suas pétalas, entreabertas, pareciam feitas de veludo. Salpicadas de gotinhas de orvalho que o sereno, também apaixonado, havia despejado sobre ela. Parou diante dela encantado com tamanha beleza e ouviu uma voz maviosa que disse:
- Ó, Deus, que injusta a natureza! Como pode alguém de voz tão bonita ser ao mesmo tempo tão mau?
Nosso herói ficou atônito ao notar que, primeiro o grito e agora aquela voz tão sofrida e meiga, vinham da mesma rosa tão bela.
E falou:
- O que dizes bela rosa?
Ao que ela retrucou:
- Ó, senhor galo! Como pode o senhor, um galo de tão bela aparência com esta plumagem negra e de voz tão bonita e romântica, ser ao mesmo tempo tão malvado, a ponto de bicar o meu caule?
- Ó, perdão, linda rosa! Mil perdões! Juro que não foi minha a intenção de magoá-la desta maneira... Disse o galo reverente e envergonhado.
- Ah, é... Pois veja só o estrago que o senhor me fez!
- É... Mas você também me espetou. E quase pegou no meu olho.
- Bem feito, seu galo malvado e perverso...
E o galo tentou desculpar-se de todas as formas e maneiras.
- Ó, minha bela, minha rosa, me desculpe! Perdoa-me... Eu lhe peço mil perdões... E prometo que de hoje em diante serei mais cuidadoso e nunca mais andarei por aí bicando à toa.
E houve um grande silêncio.
Os dois se olharam demoradamente...
E na linguagem muda dos olhos, disseram tudo um para o outro.
E aquele olhar mútuo durou um tempo infinito.
Tanto tempo que o sol andou no céu mudando de lugar e fazendo com que a sombra de uma árvore próxima, que tudo observava, (fofoqueira...) caísse sobre os dois enamorados.
O resultado é óbvio. Um perdoou o outro e ficou tudo bem entre eles.
O galo Orfeu fez-lhe vários e rasgados galanteios e despediu-se para voltar ao seu terreiro.
Mas não sem antes marcar um novo encontro.
Prometeu voltar no dia seguinte para vê-la novamente.


A rosa apaixonada ficou saudosa, pensando nele até que a noite caiu sobre o roseiral.
Mas, cá pra nós, e rosa se apaixona?
Nosso galo Orfeu, por sua vez, voltou para o seu poleiro.
E lá ficou olhando pra lua e pensando na rosa até o sono chegar.
(e galo lá pensa?)
Mas... Ó, decepção!
O destino caprichoso fez com que o dia seguinte amanhecesse chuvoso.
O céu nublado escondia o sol e uma chuva fina e persistente inundava o chão enlameado.
Adeus encontro! E o nosso Orfeu não pode rever sua amada rosa.
E ele passou o dia inteiro jururu, encolhido em seu poleiro.
Nossa amiga rosa também não teve um bom dia.
Entristecida, misturava suas lágrimas aos pingos que caíam da chuva.
(E rosa chora?)
E assim passou-se aquele dia... E mais outro. E outro mais...
Para os dois enamorados o tempo parecia uma eternidade.
E a chuva... Chovia. E chovia sem parar.
No galinheiro, a galinhada em geral fofocava sobre o que haveria de errado com o galo Orfeu.
Nem parecia o mesmo. Ele que sempre fora alegre e brincalhão, embora romântico, agora vivia triste e macambúzio.
A chuva chovia e ele ali triste e caladão. O coração doído e cheio de saudades.
Somente uma vez desceu do poleiro, para pegar uma gorda minhoca que se rebolava bem na sua frente.
Houve até quem tentasse consolá-lo puxando conversa, mas nada...
Um pintinho, já meio taludinho, que vinha a ser seu contraparente, pois era filho de um galo viúvo, que se casara com uma tia do Orfeu.
Ele tentou saber a razão de tanta tristeza e melancolia. Mas tudo em vão. Não conseguiu tirar nem uma palavra de Orfeu.
Ó, paixão! Ó, paixão!
A rosa Eurídice também teve quem lhe oferecesse um ombro amigo.
(e rosa lá tem ombro?).
Outra rosa amarela, também bela e quase tão bonita quanto ela. Grande amiga, quase irmã... Também tentou e tentou. Mas nada adiantou.
Eurídice, a rosa vermelha, chorava e chorava. E por pouco não se desmanchava.
E durante o período das chuvas, nas noites insones, os dois enamorados pensavam... E sonhavam...
A rosa sonhou que o galo a esperava no altar todo chique, vestido de fraque e cartola.
(Você já pensou um galo de fraque e cartola?)
E ela toda vistosa, arrastava a cauda do vestido de noiva ao entrar na igreja.
(Só em sonho...).
E aí eu pergunto a você:
- E rosa, sonha? Ah, deixa pra lá...
Continuando nossa história...
Orfeu também teve lá seus sonhos.
Ambos sonharam. Sonhos nem sempre iguais, porém muito parecidos. E neles havia sempre um final feliz.
Ah! O amor é lindo!
Mas, “não há mal que sempre dure nem bem que nunca se acabe...” Já dizia minha mãe.
E aí... Ó milagre! A natureza resolveu cooperar.
E a chuva parou de chover.



O dia amanheceu em festa e o sol brilhou no firmamento.
Orfeu desceu do poleiro com tanta pressa que torceu o pé e quase caía, não fosse sua esperteza de bater as asas rapidamente, para se equilibrar.
Já refeito do susto abriu o bico e o peito, e soltou a voz...
- Cocoró... Có!!!
Saudando o sol e a natureza em festa.
Seu canto foi mais alto, mais forte e mais sonoro do que nunca, na esperança de que sua amada o ouvisse.
E saiu saltitante, embora ainda claudicante por causa da dor no pé. Porém com o peito em festa e o coração a gargalhar... Mais feliz impossível.
Alegre como criança quando volta da escola.
E ansioso por chegar mais depressa ao roseiral para ver sua amada, pulava e batia as asas tentando pequenos...
A rosa escarlate desabrochou quase que por inteiro. E estava muito mais bonita e viçosa. Realmente linda com o sol brilhando em suas pétalas, e com muito mais amor no coração.
(E rosa tem coração?)
Enfim, Orfeu chegou ao bosque florido. E embora a distância não fosse tão grande, pareceu-lhe imensa.
E ele chegou arfante. Com o coração quase saindo pela boca, ou melhor, dizendo... Pelo bico. Mas, satisfeito e sorridente.
(E galo sorri?)
Ah! O amor, realmente é liiiindo!
E ficaram ali, defronte um do outro... Se olhando, se olhando...
Nossa musa, toda envaidecida, também se empertigou como pôde, sobrepondo-se às outras de sua espécie. Rubras pela cor e mortas de inveja.
E houve o maior “tititi” no roseiral.
- Ele voltou, ele voltou... Sussurravam as flores entre si.
Um cravo branco que olhava de longe teve um “piti” de raiva e de inveja.
E cochichou despeitado com a árvore, aquela tal fofoqueira:
- Galo enxerido!... Por que ele não vai se engraçar com as suas galinhas?
Mas... Ó! O amor!... Os dois, alheios a tudo e a todos, eram só paixão.
Mais pareciam dois pombinhos arrulhando...
E assim ficaram... Trocando juras de amor por muito tempo...
Uma eternidade...
Mas para os dois passou muito rápido. Para os dois apaixonados, o tempo voou... E chegou a hora da despedida...
E com incrível ternura, Orfeu deu uma delicada bicadinha, bem de levezinho, no miolo da rosa e despediu-se entre juras de amor.


E assim foi... Até que um dia... Eurídice, a rosa escarlate morreu.
Numa noite... Deu um pé de vento tão forte, mas tão forte...
(Cá entre nós, e vento tem pé?)
Foi uma ventania de dar medo.
E no dia seguinte... Da rosa, só sobrou o talo.
O resto, o vento levou...
Ó! O destino!
Orfeu, triste e acabrunhado, com o coração despedaçado pela perda de sua amada, viveu seus dias de saudade, triste e amargurado, até que numa outra noite...
Uma raposa atacou o galinheiro...
E ele morreu heroicamente...
Lutando bravamente até seu último suspiro.







Hei... Psiu... Não chore! Não vá embora!
A história ainda não acabou...










Reza a lenda que...
Assim como nós, humanos, também outros seres de outras espécies, tais como “galos” e “rosas” e mais alguns, porém, que tenham bom coração. Quando morrem aqui na terra, vão para outro lugar.
Para um céu especial, só para eles.
E lá, eles vivem outra vida, cheia de paz, amor e felicidade.
E foi assim que...
Um belo dia os anjos tocaram suas trombetas para anunciar a chegada de nosso bravo galo Orfeu.
As portas do paraíso se abriram e ele foi recebido com honras de herói.
E adivinhem quem já estava lá esperando por ele?
Acertou quem disse que era a sua amada e bela Eurídice, a rosa vermelha escarlate.
E nesse dia houve uma grande festa.E eles viveram felizes para sempre...







O sol brilhou naquela manhã, iluminando
também a casa onde morava um casal e sua filha Rosa. E seria mais um dia comum igual aos demais.
Dona Amélia acordou e foi fazer café, e começou seus afazeres diários acordando sua filha que era muito dorminhoca...
A mãe entra no quarto da filha, abre as janelas e diz:
- Rosa, acorda Rosa!
Você vai perder a hora, menina. Levanta Rosinha!
A menina se espreguiça, boceja e fala para sua mãe:
- Ah, mãe! Sonhei um sonho tão lindo!
Ela se levanta. E enquanto vai se arrumando para ir para a escola, vai contando para sua mãe o sonho que teve...
- Sabe, mãe, eu tive um sonho lindo...
Sonhei uma história muito linda e tão diferente...
Era até um pouco triste, mas também muito bonita.
Tinha um galo chamado Orfeu que namorava uma rosa chamada Eurídice...
Pena que foi só um sonho. Mas foi um lindo sonho.
Já era segunda-feira... E era dia de aula.

O Sonho da Rosa...


Conto infantil para crianças de qualquer idade...